terça-feira, 29 de agosto de 2017

Apesar da hecatombe e do marasmo, é preciso lutar contra o golpe





O brilho da luz que se aproximava era cada vez mais intenso, tudo levava a crer que iríamos sair do túnel, um eterno tunel de uma eterna viagem na escuridão. A aparente tranquilidade que havia dentro de cada um dos vagões do trem começava a ser quebrada com as trepidações e solavancos que a cada momento tornavam-se intensos; a composição não suportou; vindo a se descarrilhar e em seguida tomba descendo ladeira abaixo, até se lançar no espaço vazio numa queda que parece não ter fim. Os ocupantes vão aos poucos se recobrando do choque e logo percebem que luz vinha agora sobre suas cabeças e gradativamente ia se afastando; estavam em queda livre a espera do fundo do poço.

Nessas horas de apreensão e medo um filme curtíssimo e rápido projeta nas mentes uma longa vida, mas aqui nesse trem são as imagens de um país e da sua República.

Uma crise política e econômica do Império foi aparentemente solucionada com uma República. Longe de se rejeitar essa forma de governo, a sua introdução na vida do país teve a mesma prática de sempre, a não participação do público,mas inaugurou, como forma de solucionar todos os males, a instituição Golpe, forte até hoje. E assim as decisões saíram dos palácios e foram parar nos gabinetes.

sábado, 19 de agosto de 2017

Podres de ricos investem no desastre social


Extra Classe

Entrevista com Antonio David Cattani, por Flavio Ilha





Fotos: Igor Sperotto
Economista, professor e um dos mais respeitados pesquisadores sobre a concentração de riqueza no mundo, Antonio David Cattani está lançando um novo livro. Em Ricos, podres de rico (Tomo Editorial, 64 páginas), disseca de forma didática e acessível – “sem economês”, salienta – como o aumento da riqueza nas mãos de poucas empresas ou pessoas é um risco à democracia, além de uma ameaça ao próprio capitalismo. “A crise de 1929 foi provocada pelo mesmo fenômeno que estamos observando agora. Em um, dois anos, vamos ultrapassar aquele patamar de concentração. É a crônica de um desastre anunciado”, diz nesta entrevista ao Extra Classe.
Extra Classe – O senhor estuda a concentração de riqueza nas mãos de poucas pessoas há pelo menos dez anos. A que conclusões chegou nesse período?

Antonio Davi Cattani – Meu argumento é que a concentração de renda com a existência de multimilionários é nefasta para a economia e para a democracia. Para a democracia parece evidente, gera corrupção, tráfico de influência. Mas na economia persiste uma discussão sobre a importância de se acumular riqueza antes de distribuí-la. Em outras palavras, a tese de que a concentração de renda criaria mecanismos de maior eficiência econômica para investimentos produtivos que gerassem mais empregos e oportunidades. Bem, dez anos depois posso afirmar que isso é uma falácia. Uma mentira deslavada. Um discurso dos ricos, que querem apenas justificar seus rendimentos e seus privilégios.
EC – Não se trata de um fenômeno do capitalismo brasileiro?

Cattani – Não, de jeito nenhum. Em nenhum capitalismo, em nenhum lugar, a acumulação volta para a sociedade. Em outro livro (A Riqueza Desmistificada, 2007) eu analiso a situação dos Estados Unidos, onde há uma redução de impostos para os mais ricos, desde o primeiro governo de Bill Clinton (a partir de 1993) até o Barak Obama. Mostro ali que, ao contrário do que justificam os teóricos da concentração, não há mais investimentos, mas apenas mais especulação, o que gera instabilidade econômica e mais consumo de produtos de alto luxo, iates, jatinhos, viagens ao espaço. Os podres de rico têm tanto dinheiro que em determinado momento surge a seguinte questão: investir mais para quê? Para se incomodar contratando mais gente? Se eu posso ganhar dinheiro, muito dinheiro, com isenções, com privilégios fiscais? No caso brasileiro, que você menciona, o agravante é que a concentração de riqueza permite comprar, entre outras coisas, o próprio Congresso. Dou o exemplo da JBS, que investiu milhões de reais, centenas de milhões de reais, em todos os partidos, por uma razão bem objetiva: defender seus privilégios. Os bancos, a indústria farmacêutica, o ensino particular, o agronegócio, todos usam essa estratégia. Isso é um atentado à democracia.